Sem elas, nenhum barco a motor vai a lugar algum. Mas poucos donos de lanchas dão a devida importância a este equipamento tão fundamental quanto o próprio motor. Você já deve ter vivido isso. Planeja o passeio, convoca a família, convida os amigos, liga para a marina mandando colocar a lancha na água e, lá chegando, liga a chave, aciona a partida e… nada. O motor mal se move.
Pronto! Lá se foi o passeio. E por causa da bateria, que está descarregada. Para evitar isso, há alguns cuidados a serem tomados, mas o primeiro de todos é saber se a bateria está dimensionada para a carga necessária a bordo.
Dimensionar as baterias de um barco é algo que exige certa habilidade com números, mas não chega a ser complicado. Mas, antes de mais nada, é preciso compreender como se mede a carga de uma bateria, o que é dado em Ah ou “ampères-hora” e que, ao contrário do que muita gente imagina, não significa ampères “por” hora. Esta medida apenas indica a corrente elétrica constante liberada durante um período de 20 horas, antes de a bateria ficar sem carga.
Para saber de quanto é essa corrente, basta dividir o número de Ah por 20. Assim sendo, uma bateria de 100 Ah, por exemplo, proporciona 5 A durante 20 horas, entendeu? Com base nisso, defina quantos aparelhos elétricos e eletrônicos terão de ser alimentados pela bateria e se a rede de energia a bordo é de 110/220 V e 12 V (por meio do uso de um inversor) ou apenas 12 V.
Em seguida, faça uma lista de todos os aparelhos a bordo e verifique qual a potência de cada um (para aparelhos de 110 V) ou o consumo em ampères (para aparelhos de 12 V).
Vamos supor que você queira instalar um forno micro-ondas (cuja potência é de 1 300 W), uma tv (200 W), duas bombas de porão (5 A cada), uma bomba de água doce (6 A), luzes de fundeio (1 A) e um gps de 5 polegadas com sonda (1 A).
Nesse caso, você deve transformar em ampères todas as medidas e somar. Para fazer essa conversão, divida o valor indicado em Watts por 12. No caso da tv, por exemplo, 200 W ÷ 12 = 16,7 A. Faça, então, uma estimativa de quanto tempo utilizará cada aparelho por dia e multiplique esse tempo pela potência do aparelho.
Para a tv, três horas por dia estão de bom tamanho. Para o micro-ondas, calcule no máximo meia hora. Gps com sonda, cerca de oito horas. Luzes de fundeio, outras oito horas/dia. E assim por diante. No caso da tv, a conta seria 16,7 A x 3 horas, o que dá 50 A/dia. O micro-ondas, 55 A/dia. O gps com sonda, 8 A/dia. Pronto: é só somar tudo e obter o consumo diário estimado para a sua lancha.
Por fim, para ter uma margem de segurança de dois dias sem ter de recarregar as baterias, multiplique o consumo total por dois. Assim, se o consumo diário foi de aproximadamente 140 A, a capacidade das baterias deve ser de 280 Ah (ampère-hora). Como não existe uma bateria com tanta energia, é preciso montar um banco com algumas delas — por exemplo, duas baterias de 150 Ah, ou quatro de 75 Ah.
Lembre-se, contudo, que não é recomendável ligar todos os aparelhos ao mesmo tempo, pois as baterias não geram toda a energia que o fabricante estipula em Ah na embalagem. Este valor representa o que ela libera em 20 horas diretas.
Ou seja, uma bateria de 100 Ah gera 5 A por 20 horas seguidas. Desse modo, com o nosso hipotético banco de baterias só seria possível ligar, ao mesmo tempo, aparelhos com o consumo somado de até 30 A.
Uma última precaução: o banco de baterias não deve estar conectado diretamente ao motor, sob o risco de ficar sem partida, caso elas descarreguem. O motor exige uma bateria exclusiva para ele. Mas, durante a navegação, é recomendável ligar o motor ao banco de baterias, para recarregá-las.
Algumas dicas para não ficar sem bateria na hora H:
- Ligar ou mandar ligar o motor pelo menos uma vez por semana:
Baterias do tipo chumbo-ácido têm uma taxa natural de autodescarga mensal que vai de 1% nas melhores marcas (feitas com ligas de PbCa/chumbo-cálcio ou PbCaAg/chumbo-cálcio prata) a 10% nas mais comuns (liga de PbSb/chumbo-antimônio).
- Mas outros fatores também aceleram a autodescarga, como temperatura ambiente elevada, alta umidade e tempo de uso da bateria. Por isso, mesmo que não pretenda sair com o barco, ligue (ou peça para alguém da marina ligar) o motor pelo menos uma vez por semana, a fim de repor essa perda natural de energia de toda bateria.
- Aguardar um tempo entre uma tentativa e outra de partida:
Por duas razões básicas: a primeira é que a energia elétrica da bateria vem de uma reação química. Portanto, deixá-la “repousar” entre uma tentativa e outra permite que essa reação se complete, “acumulando” assim energia suficiente para a próxima tentativa. E a segunda razão é evitar superaquecimento do motor de arranque.
- Só usar baterias do tipo “náutico”:
Há algumas características importantes que as baterias para uso náutico têm que as comuns, de automóveis, costumam não apresentar, como capacidade de operar inclinadas, maior resistência a temperaturas elevadas, maior controle da emissão de gases nocivos, maior resistência mecânica da estrutura, menor taxa de autodescarga e maior vida em ciclos de carga-descarga.
- Ao recarregar a bateria, faça isso bem lentamente:
A corrente elétrica máxima para recarregar uma bateria é de 10% do valor de sua capacidade. Exemplo: uma bateria de 100Ah deve receber, no máximo, 10Ah. Correntes maiores que isso geram superaquecimento, o que causa danos permanentes. E baterias armazenadas por muito tempo devem ser carregadas com correntes ainda menores, perto de 5%.
Quanto cada coisa consome.
O consumo médio de energia dos equipamentos mais frequentes em um barco:
amperes / horas uso/ amperes dia
luz da âncora 0,80 12h00 9,60
Guindaste da âncora 150,00 0h12 30,00
Piloto automático 0,70 8h00 5,60
Exaustor do porão 6,50 0h12 1,30
2 ventiladores na cabine 0,20 48h00 9,60
3 lâmpadas fluorescentes p/ a cabine 0,70 12h00 8,40
1 lâmpada incandescente p/ a cabine 2,10 1h00 2,10
1 lâmpada p/ mesa de navegação (10 W) 0,80 0h30 0,40
Iluminação da bússola 0,10 8h00 0,80
Iluminação do convés 6,00 0h30 3,00
Sonda de profundidade 0,20 8h00 1,60
Indicador de combustível 0,30 24h00 7,20
GPS 0,50 8h00 4,00
Inversor 0,20 2h00 0,40
Forno de micro-ondas (600 W) 100,00 0h06 10,00
Bomba de porão 15,00 0h06 1,50
Bomba de água doce 6,00 0h02 0,20
Bomba do tanque de esgoto 2,00 3h00 0,10
Radar 4,00 4h00 16,00
2 lâmpadas halogênicas p/ leitura 0,80 4h00 3,20
Geladeira 5,00 12h00 60,00
Luz de navegação 2,50 8h00 20,00
Luz de navegação tricolor 0,80 8h00 6,40
Toca-fitas 1,00 2h00 2,00
Televisão (13 polegadas) 3,50 2h00 7,00
Hodômetro 0,10 8h00 0,80
SSB (receptor) 30,00 0h12 2,50
SSB (transmissor) 30,00 0h12 6,00
Videocassete 2,00 2h00 4,00
VHF (receptor) 0,50 4h00 2,00
VHF (transmissor) 5,00 0h12 1,00
Indicador de vento 0,10 8h00 0,80
DVD 1,10 4h00 4,40
Como recarregar? As respostas para as dúvidas mais frequentes:
- O tempo para recarregar uma bateria depende da potência do carregador?
Não. Uma bateria obtém energia a partir de uma reação química. Para recarregá-la, é preciso “reverter” esta reação, aplicando uma tensão (V, de volt) e uma corrente elétrica (A, de ampère).
Este processo ocorre em uma velocidade própria, que, quando não respeitada, gera um recarregamento apenas parcial e pode danificar a bateria para sempre. Em geral, o tempo de recarga deve ficar entre 8 e 12 horas, independentemente da potência do carregador de energia de toda bateria.
- Usar o alternador do motor é bom para recarregar a bateria?
É uma forma simples, mas precária. Na maioria dos casos, o conjunto alternador/regulador fornece tensão entre 13 V e 14 V e correntes elevadas. Com isso, uma bateria descarregada receberá uma corrente acima da recomendada e, na medida em que sua carga for aumentando, a tensão do alternador se tornará insuficiente para continuar o processo de recarga. Resultado: uma recarga parcial (de 70% a 80% da capacidade), além da diminuição na vida útil da bateria.
- Painéis solares são eficientes para recarregar uma bateria?
São bons para manter as baterias carregadas quando o barco não estiver em uso, suprindo assim a “autodescarga” que toda bateria sofre. Um painel solar moderno, rígido ou flexível, com 0,6 m x 0,3 m, pode gerar até mais mais de 100w, reduzindo espaços e ampliando as possibilidade de locais de instalação. Essa tecnologia evoluiu muito nos últimos dez anos.
Para recarregar uma bateria de 150 Ah (ampères/hora), com meia carga, ele exigirá, portanto, cerca de 53 horas de sol forte. E se for um painel flexível, subirá para 120 h! Portanto, convém avaliar se o investimento em painéis realmente vale a pena, caso o principal objetivo seja recarregar baterias.
- E os geradores eólicos, muito usados nos veleiros?
Sim, mas com ressalvas. A maior vantagem dos geradores eólicos é funcionar dia e noite, pois não dependem da luz solar, como os painéis — mas, desde que os ventos estejam acima dos 10 km/h. Para um gerador médio, com um diâmetro próximo de 1,2 m, ventos de 20 km/h podem gerar em torno de 3 A (14 V).
É, portanto, uma boa opção para quem navega em locais de vento constante, como o Nordeste, por exemplo. Mas, mesmo nessas condições, serão necessárias mais de 25 horas para deixar uma bateria de 150 Ah a meia carga. O investimento é alto e a interferência estética no barco, grande, além do que, nos modelos com três pás, o ruído gerado em ventos mais fortes é muito incômodo.
- Por que não se deve deixar um carregador comum ligado à bateria por muito tempo?
Porque, em geral, eles operam com corrente constante, ou seja, vão aumentado a tensão sobre a bateria na medida em que ela se carrega. Esta tensão não deveria ultrapassar 14,8 V ou 15 V. Dentro desse limite, evitaria o superaquecimento e a decomposição do líquido da bateria. Ocorre, contudo, que este tipo de carregador não tem capacidade de ir diminuindo a corrente/tensão. Por isso, pode danificar a bateria se não for desconectado a tempo.
Já no caso de carregadores com capacidade de flutuação, a coisa é bem diferente e a eficiência e segurança é muito maior.
O que levar em conta ao instalar?
- Peso. Uma bateria pesa cerca de 45 quilos e quanto mais abaixo da linha d’água e centralizada ela estiver, melhor para a estabilidade do barco.
- Ventilação. Toda bateria emite gases potencialmente perigosos, o que exige bom sistema de exaustão — além disso, boa ventilação evita o aquecimento inadequado delas.
- Acesso. É fundamental que estejam à vista. Baterias “escondidas” são um incômodo e risco. Instale-as o mais próximo possível do motor. Assim, você evita a perda de energia através dos cabos. Se isto não for possível, use cabos de maior diâmetro.
- Tipos. Nunca misture baterias velhas com novas, porque as já usadas comprometerão a durabilidade das novas.
Fonte: Revista Náutica