Dependendo da situação, a grande maioria das pessoas enjoa no mar. E o maior problema é que, depois que o mal-estar começa, não há remédio que dê jeito. Mas prevenir é possível! Veja como:
Só quem já sentiu na própria pele — ou, melhor dizendo, no estômago, embora o principal causador não seja ele — o desconforto causado pelo balanço intermitente de um barco na água, sabe o quanto o enjoo incomoda. E raros são os que nunca sentiram isso, já que a grande maioria das pessoas enjoa no mar.
Mas só mesmo quem já teve vontade de se atirar na água e voltar nadando em busca de alívio imediato sabe, de fato, o quanto o enjoo no mar pode perturbar — bem mais do que apenas “incomodar”. Quando isso acontece, tudo o que se quer é sair dali. E uma pergunta fica martelando na cabeça: por que eu vim?
Geralmente, o enjoo começa com um ou outro bocejo, acompanhado de uma leve tontura. Em seguida, o rosto vai ficando pálido e o corpo, pesado, como se estivesse fatigado. Logo depois, vêm as náuseas — que tanto podem ser leves quanto evoluírem para o vômito, dependendo do organismo de cada pessoa.
E o pior é que vomitar nem sempre traz alívio imediato. Muitas vezes, não traz alívio algum e ainda faz com que as outras pessoas também fiquem enjoadas. Ou seja, acaba o passeio de todo mundo e não apenas de quem está mareado. É um transtorno só!
Além disso, surge uma sensação de cansaço, tão insuportável que tira a disposição até mesmo para conversar. Por isso, a pessoa enjoada quase sempre fica calada e recolhida num canto do barco (muitas vezes na cabine, o que é pior ainda, porque a falta de ventilação só agrava o mal-estar), na esperança de que o enjoo vá embora sozinho.
Até porque a “vergonha” de estar naquela situação constrangedora, enquanto todos os outros a bordo se divertem, é ainda mais humilhante. Nessas horas, tudo o que se quer é chegar logo onde quer que seja ou tentar dormir, sonhando em acordar como quem desperta de um pesadelo.
Exagero? Quem costuma sofrer deste mal, que os médicos chamam de “cinetose” ou “enjoo do movimento”, sabe muito bem que não existe exagero algum nisso. E quem já testemunhou alguém profundamente mareado a bordo sabe o quanto os outros passageiros sofrem junto.
Seja pela preocupação com a vítima (que pode até desidratar seriamente, se não parar de vomitar, especialmente se for criança) ou porque o próprio passeio pode terminar mais cedo, justamente por causa disso — já que, às vezes, a única saída é retornar ao porto e desembarcar a pessoa.
Mas, uma vez em terra firme, tudo passa em questão de minutos. Porém, nem todo mundo enjoa da mesma maneira. Há os que sentem apenas uma leve zonzeira, enquanto outros desabam logo nos primeiros balanços do barco. Estes, em geral, padecem do mal desde a infância, quando até as curvas de uma estrada sinuosa ou certos brinquedos de ação do parquinho de diversões transformavam-se em pesadelos instantâneos.
A diferença é que, naqueles casos, bastava parar e descer. Já num barco fica mais difícil e, por isso, é preciso estar preparado para lidar com a própria propensão a enjoar. Antes de mais nada, é preciso saber que dormir pouco, beber muito ou comer exageradamente antes ou durante a saída de barco são um atalho certeiro para a indisposição.
Além disso, recomenda-se evitar fumar, comer doces, tomar café ou qualquer outra bebida à base de cafeína, como a Coca-Cola, que, inclusive, erroneamente costuma ser sugerida como antídoto para os desarranjos estomacais. Nada poderia ser mais bombástico para um mareado…
O correto é: quem costuma marear deve procurar um médico, que, muito provavelmente irá receitar um antiemético, nome que se dá aos medicamentos contra enjoo. Ele deve ser tomado bem antes de embarcar no barco, de preferência já no dia anterior, porque depois que o enjoo começa os remédios são de pouca serventia. O enjoo é o típico caso em que prevenir é mesmo o único remédio.
Deve-se, também, ficar sempre fora da cabine e onde o balanço do barco seja menos perceptível, como na popa e jamais na proa. Mas é necessário fugir de cheiros fortes, como o de combustível ou comida, e tentar olhar só para o horizonte, evitando movimentar a cabeça.
Outro cuidado importante é sentar-se perto da borda de sotavento (ou seja, por onde o vento “sai” do barco), para, caso precise vomitar, o vento levar tudo para a água — e não para dentro do barco, o que fatalmente fará com que os outros passageiros enjoem e até vomitem também.
Entrar na cabine, ficar olhando para baixo ou tentar ler é tudo o que não se deve fazer. Procedimentos assim funcionam como um gatilho para o enjoo e levam, inevitavelmente, ao mal-estar estomacal, embora não exista nada de errado com o estômago e sim com o cérebro, porque é ele que está recebendo informações contraditórias, principalmente dos olhos e do labirinto, uma parte do ouvido responsável pelo equilíbrio do corpo.
Assim, enquanto o labirinto informa ao cérebro que a cabeça está se movendo, os olhos mostram que tudo está parado. E é este conflito que embaralha o sistema nervoso central, que tem como uma de suas funções comandar os movimentos e a postura do corpo.
O resultado dessa confusão é uma espécie de pane de comandos e uma série de alterações orgânicas, como contração do estômago, secreção de sucos gástricos, tontura, suor frio, mal-estar, vômitos, fraqueza e palidez — que podem piorar muito se o enjoo for prolongado e o mareado acabar ficando desidratado. Daí a recomendação de, após seguidos vômitos, servir água para a pessoa mareada.
“A causa mais comum do enjoo do movimento é a hipersensibilidade do labirinto, mas o problema pode, também, ser provocado por uma labirintopatia, aquilo que de maneira geral chamamos de labirintite”, explica Fernando Ganança, especialista em otoneurologia, ciência que estuda a audição e o equilíbrio do corpo.
“Mas este problema só é encarado como doença quando traz limitações sérias ao cotidiano da pessoa, como quando uma criança não consegue sequer ir para a escola sem ficar enjoada no carro”, completa. Portanto, relaxe: não há nada de errado com o fato de você, eventualmente, ficar enjoado.
Mesmo quem vive na água está sujeito ao “mal do mar”. Se serve de consolo, grandes navegadores também enjoam. Amyr Klink, por exemplo. Mas também é verdade que, com o tempo, o corpo se “acostuma” aos movimentos do barco e a pessoa passa a enjoar cada vez menos. Tanto que já existe até um tipo de treinamento para isso, chamado “reabilitação vestibular”.
Remédios: para prevenir, não para remediar
Se você sabe ou suspeita que pode ficar mareado, deve tomar algum remédio contra enjoo um bom tempo antes mesmo de embarcar. A tontura, náusea, suores frios, palidez e outros sintomas ligados ao enjoo do movimento são causados pelo aumento de uma ou mais substâncias no organismo, chamadas receptores neurais, como a dopamina, histamina, serotonina e acetilcolina, que afetam as estruturas relacionadas ao vômito e ao equilíbrio.
São nestes receptores neurais que agem os medicamentos — boa parte deles vendidos livremente nas farmácias, embora com um ou outro efeito colateral. Por isso, o correto é sempre consultar previamente um médico, para que ele indique o medicamento mais eficaz e o modo mais seguro de usá-lo.
Esta regra se aplica, também, aos medicamentos fitoterápicos e homeopáticos. Os primeiros podem provocar efeitos tóxicos, se não administrados corretamente. Já os homeopáticos podem simplesmente não surtir efeito algum — mas, em situações de emergência, podem ser tomados em conjunto com os convencionais, pois não ‘brigam’ com eles.
De todos os medicamentos do gênero, o mais popular é o Dramin, que é considerado seguro, mas com o inconveniente de provocar sonolência, o que pode acabar com a graça dos passeios. Mas também são bastante usados o Dramamine, Plasil, Meclin, Stugeron e até Buscopan e Racutan.
As reações (boas ou ruins) aos fármacos, contudo, variam de uma pessoa para outra. Por isso, algumas preferem alternativas como os adesivos de escopolamina, que liberam o medicamento gradualmente por até três dias, ou, ainda, acupuntura e outros métodos naturais. Certo mesmo é que não adianta tomar o remédio que for quando o enjoo já começou. O correto é tomá-lo sempre antes, bem antes, de embarcar, para dar tempo de fazer efeito.
Para os que enjoam, uma boa notícia: já existem exercícios que “acostumam” o corpo aos balanços de um barco. Trata-se de uma forma de terapia ainda pouco conhecida, baseada em exercícios frequentes para os olhos, cabeça e corpo, que estimulam a parte do labirinto que responde pelo equilíbrio — como uma espécie de simulação do balanço do mar.
Exercícios contra o enjoo: o que você pode praticar, em casa, para não sofrer no barco
- Com a cabeça fixa, movimente seguidamente, por dez vezes, os olhos para a direita e a esquerda. Depois, repita o exercício erguendo os olhos para cima e para baixo.
- Com um dos braços estendido, aproxime e afaste o dedo indicador do nariz, acompanhando o movimento com os olhos. Faça isso até que sinta um ligeiro desconforto, ou seja, quando seu braço começar a perder força e coordenação.
- Movimente a cabeça alternadamente para a direita e para a esquerda, para cima e para baixo. Faça isso o mais rápido que conseguir.
- Dando uma de malabarista, jogue uma pequena bola de uma mão para a outra, fazendo-a passar por cima da cabeça. O mais importante é acompanhar os movimentos da bola com os olhos.
- Com um dos braços estendidos, acompanhe com os olhos e a cabeça fixa, o dedo indicador em um movimento que descreva um grande círculo, nos sentidos horário e anti-horário.
- Sentado, jogue uma bolinha para cima, pegando-a com a mesma mão. Acompanhe o movimento com os olhos. Faça isso 20 vezes. E repita o processo em pé.
- Novamente de pé, jogue a bolinha na parede e pegue-a de volta, sem desgrudar os olhos dela.
- É o exercício mais simples — e o mais cansativo. Sente e levante de uma cadeira por dez vezes seguidas.
Fique descalço e ande em linha reta, tomando o cuidado de manter a cabeça erguida e olhando sempre para a frente, como uma modelo na passarela. Faça isso entre três e cinco minutos.
- Em seguida, sem parar, ande por mais alguns minutos em linha reta, olhando para os lados, alternadamente para a direita e a esquerda.
- Continue andando em linha reta, só que agora olhando para cima e para baixo, alternadamente.
- De pé, levante um dos joelhos e passe uma bolinha por baixo da coxa. Repita o movimento, com o lado oposto.
“Normalmente, são necessárias cerca de oito a doze sessões no consultório de um otoneurologista para surgirem os primeiros resultados”, diz Fernando Ganança. “Depois disso, o paciente aprende os exercícios e pode fazê-los em casa mesmo”.
“Com a reabilitação vestibular, o organismo da pessoa se acostuma de tal forma com a movimentação que o balanço do barco vira apenas mais um deles e o corpo nem sente”, completa a otorrinolaringologista Maria Cristina Cury, professora da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto.
É um sopro de esperança para quem vive dependente de medicamentos contra enjoos (Dramin, adesivos de escopolamina, etc., etc.), que por atuarem no sistema nervoso quase sempre causam sonolência. E sonolência, tal qual o próprio enjoo, também tira a graça de qualquer passeio no mar. Portanto, o negócio é prevenir, porque, depois que o enjoo começa, nem remédio ajuda. Só mesmo voltar para terra firme.
15 truques para (tentar) não enjoar
- Tome remédio contra enjoo no mínimo uma hora antes de embarcar, para dar tempo de fazer efeito, já que os medicamentos são preventivos, não corretivos.
- Durma bastante e bem no dia anterior e não tome nenhum tipo de bebida alcoólica na véspera. Cansaço e ressaca não combinam com o balanço do mar.
- Alimente-se normalmente antes do passeio, mas sem exageros. Estômago cheio provoca enjoo. Vazio demais, também.
- A bordo, evite gorduras, temperos, coisas demasiadamente salgadas ou bebidas com cafeína, como, por exemplo, Coca-Cola. Fumar também pode.
- Evite entrar na cabine ou olhar para baixo. Pode dar tontura na hora. Se for sair para pescar, apronte todo o material antes de subir no barco.
- Se tiver que entrar na cabine, evite fazê-lo no início do passeio, a fim de permitir que seu organismo, pelo menos, se acostume um pouco com o balanço do corpo.
- Nem tente ler, fotografar, cozinhar, olhar pelo binóculo e ficar mandando mensagens pelo celular, porque tudo isso acentua o mal-estar.
- Escolha um lugar confortável e bem ventilado do convés para ficar. Mas sempre do lado de fora! É melhor sentir frio do que ficar zonzo dentro do aconchego da cabine.
- Mantenha o olhar fixo no horizonte, quando o barco estiver em movimento, sem ficar olhando para a água, e tente não pensar em nada.
- Não tente ficar compensando o balanço natural do barco com o seu corpo. Faça como se estivesse montado num cavalo: suba e desça com o movimento dele.
- Fique na popa, onde balança menos nos barcos pequenos, mas bem longe de qualquer tipo de fumaça de motor, o que, infelizmente, é frequente nas lanchas.
- Só coma alimentos fáceis de digerir e em pequenas porções de cada vez, durante o passeio. E beba bastante água. Ficar sem ingerir nada deixa a pessoa debilitada.
- Deitar logo após comer pode provocar náusea intensa. Dê um tempo após cada lanche. Mas, se o enjoo apertar, deite e fique de olhos fechados.
- Se enjoar, tente dormir. O sono ajuda a recuperar as forças, faz passar o tempo e permite conviver melhor com o mal-estar.
- Se resolver dar um mergulho no mar, evite beber água salgada, porque ela costuma provocar enjoo imediato — apesar de muitas pessoas dizerem o contrário.
O que pode e o que não pode:
As comidinhas e bebidas que fazem bem — ou bem mal — para os mareados.
O que pode: pão, bolacha água e sal, banana, melão, granola, arroz, água sem gás, suco de fruta, água de coco.
O que não pode: salgadinhos, biscoitos em geral, doces em geral, carne, maionese, camarão, cerveja, refrigerante e bebidas destiladas.
Enjoo: o que é mito e o que é verdade?
“Embarcar de estômago vazio evita o enjoo”: mito! O certo é alimentar-se normalmente antes, mas apenas com refeições leves.
“Fechar os olhos diminui o desconforto causado pelo enjoo”: verdade, porque cessa o conflito entre as informações vindas da visão e do labirinto.
“Beber refrigerante alivia a náusea, já que provoca arrotos”: Mito. As bebidas gasosas aumentam a sensação de estômago cheio e, por isso, fazem o enjoo piorar.
“É possível habituar-se ao balanço dos barcos”: Verdade, porque, com o tempo e as saídas frequentes de barco, o organismo se adapta aos estímulos que provocam o enjoo do movimento.
“Os medicamentos são inúteis depois que o enjoo já começou”: Verdade. Eles devem ser tomados preventivamente antes dos estímulos conflitantes que desencadeiam o enjoo. Depois, pode ser difícil até reter o medicamento no estômago.
“Bebês não sofrem de enjoo causado pelo movimento”: Verdade! Crianças recém-nascidas não têm, ainda, o sentido da visão completamente desenvolvido e, por isso, não sofrem com o “equívoco” das informações.
“Conversar evita enjoar”: Mito. Conversar apenas distrai. Mas pode atenuar o desconforto se a pessoa ficar olhando para fora do barco e não para a outra pessoa diretamente.
“Pilotar o barco é bom para combater o enjoo”: Verdade. O piloto tem o controle parcial da situação e isso ajuda a diminuir o conflito de informações que gera o enjoo.
Fonte: Revista Náutica